sábado, 7 de maio de 2011

A REGRA LIBERTADORA


Quase todo dia jornais trazem notícias sobre maus tratos que crianças e jovens impingem uns aos outros, de maneira quase sempre dissimulada, muitas vezes abertamente. O nome internacional dado a esse esporte juvenil é bullying. Esse fenômeno interpessoal atravessa as classes sociais; tanto que até a herdeira do trono japonês foi defendida de um grupo que a importunava, fazendo pouco caso dela. Se até a filha do Imperador, por que não nossos filhos, simples plebeus ocidentais?

O medo de ser tachado de autoritário pode criar uma terra de ninguém nas relações entre jovens alunos e adultos, sejam autoridades escolares ou familiares. É por essa brecha que a crueldade entre colegas grassa, para gáudio de uns e infelicidade de outros.

Cercear a liberdade de a criança manifestar, afinal de contas, uma opinião não é modernamente aceitável. O bullying fica como se fosse não mais do que uma opinião. Fazer pouco caso de alguém não é mais do que emitir uma opinião. Mas o contexto pode impedir o outro de retrucar e se defender.

Foi exibida a pouco tempo, uma novela que se chama “Cama de gato”, onde um adolescente se apaixona por uma garota, cuja aparência não é ideal de seu grupo: ela é gordinha e desengonçada. Está implícito que ninguém deve namorá-la. Muito menos deveria um rapaz tão bonito como o galã apaixonar-se por ela. Nosso herói enfrenta a galera que goza dele, dá risada e vaia. É um belíssimo apanhado das forças que impedem a expressão real de um ponto de vista desviante. Está previsto como a gente deve ser. Não seguindo a regra, seremos objeto de escárnio, exclusão e sei lá mais o quê.

O mau aluno que não é adequado na sala de aula também cai nessa categoria, despertando sorrisos irônicos e outras expressões de desprezo. O rapaz tem que escolher a moça certa, o menino tem que saber jogar bola, ninguém pode ser gordo, muito menos pode chorar. Qualquer comportamento desviante é castigado.

Como enfrentar isso na escola? O que o adulto pode fazer para reeducar dentro da nova ideologia de que “quem não se expressa se estrumbica?” Até onde pode ir a livre expressão, sem cair na crueldade? E por que as crianças, os púberes, são tão intolerantes?

Se os adultos forem os autores das limitações, as crianças ficam mais livres para divergir, inventar e até mesmo criar. Uma escola que tem suas regras fornece o espaço para a conquista, sem que o aluno precise se expressar de forma destrutiva. Se a escola permite fazer tudo, leia-se, se ninguém propõe regras, o aluno acaba atropelando o próximo, aquele que é diferente do que a maioria inventou como correto.

Desde sempre, na aula de Educação Física, aqueles escolhidos para os times logo de início estão tranquilos porque são bons de bola. Os piores serão escolhidos por último, ficando durante minutos em grande agonia. Mas na aula de Matemática, o bom de contas vai tirar nota mais alta. Dentro dessas limitações que cada de um de nós tem, não é preciso caricaturar. O recurso à caricatura tem a ver com a falta de parâmetros. Se a escola estabelecer limites, horário, comportamento em classe, até o malfadado uniforme que já caiu em desuso total, abrem-se muitas brechas para pequenas rebeliões não obrigatoriamente cruéis.

Os professores não precisam ter medo de estabelecer normas, não cruéis, claro, para que os jovens inventem contrapontos. Se eles estão grandemente liberados, o colega passa a ser o contraponto: o gordo, o ruim de bola, o mau aluno, o gago, o que a mãe veste mal.
(Anna Veronica Mautner

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